1 de out. de 2010

138) ELEIÇÃO DOS BICHOS




Acabo de concretizar um simples, mas para mim muito significativo plano de vida: Há anos, alimentava a ideia de catalogar e dispor de forma organizada todos os livros que consegui acumular ao longo do tempo. Não são muitos, contudo, quase todos, são bons. Fim de semana após fim de semana, fui recolhendo, folheando e registrando o que até o momento já totaliza 925 livros. Agora, mantenho-os no mesmo ambiente e sob o meu rigoroso controle. Pode ser pretensão, porém e orgulhosamente, chamo a isso de minha biblioteca pessoal, meu tesouro.

O livro que registrei sob o nº 523, prendeu-me especialmente a atenção. Encontrei em sua última página minha rubrica e data indicando o término de sua leitura em 12/6/1975. É isto mesmo! 35 anos são passados desde que me deliciei com o romance/fábula de George Orwell “A Revolução dos Bichos”. Escrito em 1944, mas só publicado no pós-guerra, trata-se da mais eloqüente crítica ao socialismo ao mesmo tempo em que traz a indefectível previsão do que de fato veio a ocorrer em anos mais recentes, ou seja, o fracasso dos sistemas político/econômicos de caráter socialista centralizador e totalitário. A queda do muro de Berlim simboliza de forma contundente o que George Orwell prognosticou. Reli-o, obviamente, e sem surpresa constato que o tema, especialmente aqui no Brasil, continua atual.

Sem me alongar em demasia, lembro que os bichos da Granja Solar, liderados por Major, um dos porcos mais articulados e que a partir da narrativa de um de seus sonhos conclama todos os animais da granja a assumirem por eles mesmos o destino de suas vidas. Os animais, cada qual com a sua personalidade, são conduzidos a uma revolução. Porcos (manipuladores), cavalos (rígidos), ovelhas (alienadas), burros (esforçados e teimosos) e galinhas (dispersas) passam a seguir cegamente o que os novos líderes ditavam. Os sete mandamentos legados por Major são divulgados oficialmente e deveriam ser seguidos por todos os bichos:

1) Qualquer coisa que ande sobre duas pernas é inimigo.
2) O que anda sobre quatro pernas, ou tenha asas, é amigo.
3) Nenhum animal usará roupa.
4) Nenhum animal dormirá em cama.
5) Nenhum animal beberá álcool.
6) Nenhum animal matará outro animal.
7) Todos os animais são iguais.

Lideranças suínas, os manipuladores, especialmente Napoleão o porco líder maior, não descem dos palanques com suas campanhas políticas permanentes. A bicharada trabalha como escrava na construção de um moinho de vento e vai, assim, gradativamente perdendo a memória dos tempos em que a granja era comandada pelo Sr. Jones, o antigo dono. Sansão, o burro, passa a acordar mais cedo para trabalhar nunca se cansando de dizer que “Napoleão tem sempre razão”. As ovelhas, em grande maioria, seguem dóceis e felizes com o pasto que lhes é garantido. As galinhas, dispersas como são, nunca se organizavam para nada.

Não demorou até que os porcos, os manipuladores, passassem a morar na casa que antes pertencia ao Sr. Jones, começassem a andar somente sobre as patas traseiras, dormissem nas camas dos ex-donos, vestissem roupas, tomassem uísque e mantivessem relacionamentos escusos com os homens. Como grande parte dos animais continuava sem saber ler, os mandamentos legados por Major foram sendo alterados sem que a bicharada percebesse. Os poucos que sabiam ler e percebiam a adulteração dos mandamentos - não se sabe por que cargas d’água - preferiram se omitir.

Quando a fome, a desesperança, a nova escravidão transformaram-se em caos, ainda foi tempo do corvo Moisés profetizar que, findo o sofrimento, haveriam de encontrar a “Montanha de Açúcar, Cande”, “o lugar eternamente feliz onde nós, pobres animais, descansaremos para sempre desta nossa vida de trabalho”.

Quando só restava um dos mandamentos da revolução, mesmo assim já adulterado “Todos os animais são iguais, mas alguns animais são mais iguais que outros”, ocorre de os bichos inferiores presenciarem, às espreitas, os porcos líderes em amistosa conversa com visitas humanas a declarar que os alicerces da revolução estavam corroídos e que em breve a granja voltaria a chamar-se Granja Solar. Era o fim. Conformados, enquanto afastavam-se da janela onde espreitavam a conversa voltaram, contudo, para acompanhar uma nova e acirrada discussão que se iniciara em função de uma jogada de carteado. E surpresos, olhavam para uns e olhavam para outros e não conseguiam mais distinguir quem era humano e quem era suíno...

No próximo domingo, 3 de outubro, vamos às urnas para escolher os nossos bichos lideres. Os porcos, manipuladores como lhes é da essência, estiverem nos últimos tempos a nos contar falsos sonhos messiânicos que tiveram. Conclamaram as ovelhas que são dóceis e em maioria a continuarem pastando plácidas e inofensivas. Os burros como sempre já se dispuseram a levantar mais cedo ainda e a trabalhar muito mais. As galinhas ciscarão como nunca e sairão, certamente, em desordenada disparada cada vez que os cães fiéis aos poderosos porcos manipuladores lhes quebrarem os sigilos e mesmo assim serão mandadas para detrás das grades transformadas de vitimas em culpadas. É a História se repetindo...

Restam-nos, ainda, esperanças! Que tal mirarmos bem em bichos menos cruéis para serem nossos lideres? Sugiro a coruja. Tem inteligência, é zelosa com seus filhotes e acima de tudo tem aqueles olhos grandes que tudo veem e ainda pode girar seu pescoço a 180 graus para que nada escape de seu controle. O que acham?

Votemos, contudo, no bicho que quisermos. Isso é da democracia. Mas, uma vez no comando, não devemos nos dispersar como as galinhas e muito menos sermos dóceis como as ovelhas. E quanto aos porcos? Por que não os escolhermos na versão pururuca?


Edson Pinto
Outubro de 2010

2 comentários:

Blog do Edson Pinto disse...

De: Edson Pinto
Para: Amigos

Caros amigos:

No próximo domingo, 3 de outubro, vamos às urnas para o mais importante ato de cidadania que a democracia brasileira nos confere. Vamos eleger aqueles que, em nosso nome, conduzirão o País e por extensão até mesmo as nossas próprias vidas. Esse momento é, portanto, de muita seriedade.

Como todos nós estaremos no final de semana com nossas preocupações voltadas para esse relevante ato cívico, resolvi publicar um pouco mais cedo o meu texto da semana. Escrevi a ELEIÇÃO DOS BICHOS

Que tenhamos nosso melhor momento de lucidez votando de forma responsável e consciente!

Edson Pinto

Giba Canto disse...

Caro Edson,

Obrigado por me recordar deste livro e suas histórias...

Também prefiro os porcos na versão pururuca, à mineira, claro. ;-)

Abs, Giba Canto.